quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Os cartolas do futebol, no fundo, querem que competições como o Pan e a Olimpíada desapareçam. Ou então que as façam em Marte ou algum outro planeta

CONCORRÊNCIA INCÔMODA

por Sócrates

Os cartolas do futebol, no fundo, querem que competições como o Pan e a Olimpíada desapareçam. Ou então que as façam em Marte ou algum outro planeta

Sempre, às vésperas de uma Olimpíada, acompanhamos uma queda-de-braço entre a Federação Internacional de Futebol e o Comitê Olímpico Internacional. É que os cartolas do futebol, por possuírem uma competição que se aproxima, em grandiosidade e em receita econômico-financeira, do maior evento esportivo do planeta, acham-se no direito de exigir condições especiais para disputá-la. Em particular, quanto à parte que lhes toca na divisão dos lucros. Por esse motivo, eles jamais deram qualquer importância à sua participação nessa competição, que tem como base filosófica a valorização dos esportes em geral.É uma briga de gigantes. Nos dando conta de que um encontro como esse exige um investimento em infra-estrutura de vários bilhões de dólares e que ele só existe porque deve dar um retorno danado, não é de estranhar que todos queiram tirar a sua lasquinha. Mas o que realmente incomoda ao futebol é ser tratado como qualquer outro. Sentem-se maiores e melhores só porque possuem mais condições financeiras do que todos os demais esportes. É como um conhecido meu que, por ter conseguido se dar bem na vida, acumulou uma grana espetacular no bolso e agora não quer mais fazer as coisas que fazia antes. É programa de pobre, diz. O mais prazeroso da vida, que é a relação humana do bate-papo com os amigos, da cervejinha no boteco da esquina, no ouvir e contar piadas ou discutir futebol, já não o satisfaz. Quer mesmo é participar da chamada alta-roda, ver e, principalmente, ser visto e gastar um absurdo em recepções programadas para manter contato com os figurões da cidade. Vive infeliz o coitado, mas acha que essas são as verdadeiras atribuições a que deve responder. Sente-se superior e inatingível. O futebol age exatamente assim. Na Olimpíada de Sydney, pudemos ter um excelente exemplo dessa empáfia. Fomos com uma equipe de moleques reforçada por uns poucos maiores de 23 anos. Mesmo assim resolveram colocar todo mundo em um hotel bastante estrelado e distante da Vila Olímpica, isolando todos do espírito da competição. Alienaram-se do turbilhão de sorrisos, abraços, solidariedade e alegria que imperava entre os atletas. Ora, como é que se pode estar satisfeito com uma festa se nos afastamos dela. Se nos escondemos na arrogância que nos impede de conviver com os normais. Perguntem ao Gustavo Borges, ao Robson Caetano, à Hortência, à Paula e a todos os outros que já estiveram em várias Olimpíadas, se alguma vez foram mal recebidos, se estavam deslocados ou se ficaram infelizes. Era só o que faltava!Guga, que era a maior estrela entre os brasileiros e que, se quisesse, ficaria em qualquer lugar, fez questão, em Sydney, de se instalar na Vila Olímpica. Como ele mesmo disse, não queria perder de jeito nenhum o que de mais bonito possui essa competição: a profusão de culturas, de línguas e de costumes dos mais diversos povos do mundo ali representados. É uma oportunidade única de aprender muito em poucos dias. De comer no refeitório ao lado de um árabe, de conversar na sarjeta com um russo, de cumprimentar um canadense ou de abraçar um senegalês. É uma amostra da humanidade que se faz representar a cada quatro anos no mesmo espaço e no mesmo instante. Como perder isso? Só os pequenos, incultos e cegos se dão o direito de abrir mão dessa beleza. Como o futebol. Os nossos cartolas também não queriam participar do Pan-Americano que está prestes a se iniciar. Com a interferência do ministro do Esporte, Agnelo Queiroz, abaixaram a cabeça, voltaram atrás e estão mandando uma seleção de garotos. Sinceramente, eu não mexeria um só dedo para tanto. Se não querem ir, que fiquem. Que mantenham suas becas intocadas. Quem é que quer se sujar em Santo Domingo? Não tenham dúvidas de que se fosse em Miami todos estariam lá. Talvez até com o time principal. É que a maioria deles tem casa de veraneio na Flórida e seria uma boa oportunidade de novos contatos e umas comprinhas a mais. De qualquer forma, os cartolas do futebol, no fundo, querem é que competições como o Pan ou a Olimpíada desapareçam. Há muito esporte na concorrência. Ou então que as façam lá em Marte ou em qualquer outro planeta.

Um comentário:

Alexandre Rocha disse...

Avisa pro Doutor que: 1) O Brasil não levou nenhum atleta acima de 23 anos para Sidney. 2) O Brasil que eu me lembre não jogava em Sidney. Jogava em Brisbane. Somente a 793 km de Sidney! Ele queria o que? Que o Brasil jogasse lá e voltasse pra Vila Olimpica?????